segunda-feira, 25 de julho de 2011

NUNCA DESCUIDANDO DO DEVER, Marina Colasanti

Jamais permitiria que seu marido fosse para o trabalho com a roupa mal passada, não dissessem os colegas que era esposa descuidada. Debruçada sobre a tábua com olho vigilante, dava caça às dobras, desfazia pregas, aplainando punhos e peitos, afiando o vinco das calças. E a poder de ferro e goma, envolta em vapores, alcançava o ponto máximo da sua arte ao arrancar dos colarinhos liso brilho de celulóide.

Impecável, transitava o marido pelo tempo. Que, embora respeitando ternos e camisa, começou sub-repticiamente a marcar seu avanço na pele do rosto. Um dia notou a mulher um leve afrouxar-se das pálpebras. Semanas depois percebeu que, no sorriso, franziam-se fundos os cantos dos olhos.

Mas foi só muitos meses mais tarde que a presença de duas fortes pregas descendo dos lados do nariz até a boca tornou-se inegável. Sem nada a dizer, ela esperou a noite. Tendo finalmente certeza de que o homem dormia o mais peado dos sonos., pegou um paninho úmido e, silenciosa, ligou o ferro.
Marina Colasanti, In.; Contos de Amor Rasgados, 1986)

CASO ANTIGO , Helena Parente Cunha

Quando o conheceu, ela tinha vinte anos. Romancista, de renome se fazendo, ele se tornou para ela o sonho realizado em se realizará. Eles se encontravam uma a duas vezes por semana. Paixão, ela reverberava. Fosforescências. Ele dizia claramente, não queria se casar, não queria se juntar. Não gostava de iludir. Cada qual em dividido para se somarem no mais e no tudo. Assim ele dizia. Assim ele queria. Assim ela assentia. Na esperança de esperar, assim ela esperava. Um dia, quem sabe? Eles casariam. Os encontros semanais. Resplandecência. Durante vinte anos ela viveu feliz, à espera do que esperava. Consonâncias , as ressonâncias. Uma vez, como tantas vezes, ele viajou. Desta vez, por duas semanas. Como tantas vezes, ele não escreveu. Ao contrário do que fazia outras vezes, quando ele voltou não telefonou. E não atendeu quando ela ligou. Dissonâncias? Reacreditada, ela se esperou. Palidescências. De manhã, debaixo da porta dela, um envelope com a letra dele. um bilhete. Obscurescência. Estava tudo acabado. Ele acabava de se casar.
(Helena Parente Cunha, Cem Mentiras de Verdade, 1985.)


Esse conto de Helena Parente Cunha pode ser visto dentro de uma tradição literária latino-americana do gênero microconto cuja escrita sintética, sugestiva e poética abre possibilidades para maior reescritura da leitora (ou leitor), devido a sua alta carga evocativa. O conto acima, por fazer parte de uma produção datada dos anos 80, faz referências ao androcentrismo presente nas relações de gênero ao focalizar o poder do homem sobre a mulher, transformando-a, quando jovem, em uma pessoa ingênua, sem malícia e quando madura em uma mulher que, embora tenha perdido a ingenuidade inicial, precisa acreditar ou até mesmo apostar em suas escolhas. No entanto, essa "escolha" é diretiva, já que a sociedade patriarcal, com as suas instituições representativas e seu discurso, aprisiona a mulher dentro de uma cela de preceitos morais que dificilmente consegue escapar. A escrita das mulheres da geração de 60, em razão desse momento de ruptura com uma ordem altamente hierárquica, tendem a denunciar e problematizar as situações sociais contraditórias geradas pelo pater potestas.
 
No conto, observa-se que a função do homem é a de escritor, apontando para um traço importante do convencimento: o discurso, a linguagem metafórica, tão ao gosto dos romances, o jogo com as palavras, a manipulação das simbologias e, sobretudo, as camadas implícitas do dizer. Ela, com vinte anos, envolvida pelo código do amor romântico, com os seus mitologemas, incapaz de entender a linguagem do outro (porque não fora educada para isso) sucumbe às promessas, uma arma poderosa para manter a esperança no outro e, consequentemente, o poder sobre ele.

terça-feira, 12 de julho de 2011

Pagu - Ordem do Mérito Cultural

O Ministério da Cultura informa que está aberto o prazo para a inscrição das propostas de indicação à Ordem do Mérito Cultural para o ano de 2011. O tema central da celebração desta edição será Pagu- Sonho-Luta-Paixão em homenagem a Patrícia Rehder Galvão, conhecida pelo pseudônimo de Pagu, escritora e jornalista brasileira que teve grande destaque no movimento modernista iniciado em 1922.

Criada em 1995, pelo Ministério da Cultura, a Ordem do Mérito Cultural é o reconhecimento do Governo Federal a personalidades, grupos artísticos, iniciativas e instituições que se destacaram por suas contribuições à Cultura brasileira.
(...)
As indicações podem ser enviadas para o site do Ministério da Cultura até o dia 22 de julho, mediante o preenchimento do formulário específico disponível no endereço eletrônico do MinC , ou pelos Correios, após download do documento ser preenchido e encaminhado para o seguinte endereço:

Ordem do Mérito Cultural 2011
Ministério da Cultura
Assessoria de Comunicação Social
Esplanada dos Ministérios, Bloco B, 4º andar
CEP 70068-900 Brasília – Distrito Federal

Dúvidas e informações:
E-mail: omc2011@cultura.gov.br
Tels.: (61) 2024- 2406, com Eliane Rodrigues
 
Texto trascrito e adaptado do site: http://www.cultura.ba.gov.br/2011/06/28/minc-ja-esta-recebendo-indicacoes-para-o-premio-que-homenageara-este-ano-a-escritora-pagu/