Algumas reflexões:
"sendo a leitora gendrada marcada pelos seus pertencimentos de genero, não de sexo, ela vai tirar da cultura,do social, de sua relações de genero, de toda uma expectativa que existe e se forma em torno da representaçao do feminino, seu/s entendimento/s, sua percepção, sua recepção e sua resposta ao texto ficcional. Para ter esse entendimento a leitora gendrada não precisa de nada mais do que estar imersa num determinado contexto politico-social e cultural. Já a leitora feminista se diferencia pela consciencia que tem de si mesma, de suas questões sociais,culturais e politicas. A feminista é um sujeito em processo, é alguém que rompe com uma representação do feminino, porque consegue decodificar seu genero, se diferenciar enquanto agente de sua propria existencia. O genero é um construto cultural, social e político; já o feminismo é uma subversão construtiva de um sujeito emergente dentro de uma dada sociedade. Logo a leitora gendrada leva para o ato interpretativo da leitura seus/suas especificidades de genero, geralmente de forma inconsciente, não reflexiva, com isso ela não rompe com o padrão cultural nas suas possibilidades de construção interpretativa do texto. O que não acontece com a leitora feminista que consciente de seu lugar, de seu papel de sujeito, do seu discurso, rompe com a cultura e subverte o "status quo". Veja as leituras de Viginia Woolf ao escrever sobre profissões para mulheres e/ou a irmã de Shakespeare(Judith), em UM QUARTO TODO SEU."
( Nadilza Moreira,UFPb, nadilza@zaz.com.br )
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"Quanto as suas questões, acho que o primeiro termo deve ser 'genderizada', vem do inglês "gender". No discurso feminista anglo-americano o termo 'gender' vem sendo usado para designar o significado social, cultural e psicológico imposto sobre a identidade sexual biológica da mulher. Já uma leitora feminista implica que tal leitora tem uma postura política, ou seja, exerce sua cidadania como uma verdadeira feminista que significa uma prática de vida, portanto, consciente da discriminação sexual contra a mulher."
(Clélia Reis Geha, UNICAP,reisgeha@novaera.com.br )
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"Todas nós somos leitoras gendradas. Entre outras categorias que constróem nossa identidade (raça, classe, valores e posições diversas) somos também marcadas por especificidades de gênero que nos delimitam como a mulher que somos com toda a pluralidade de vozes que nos habitam. Um ser gendrado é um ser inserido na dinâmica social e cultural relacionadas à experiência sexuada e aos valores, normas, regras e configurações vinculados a essa experiência. Já uma leitura feminista requer, em primeiro lugar, que nós evidenciemos a estrutura gendrada do ser humano, ou seja, é preciso colocar o foco de análise nos sistemas ideológicos que regem a existência humana sexuada buscando reconhecer os mecanismos de controle dos símbolos culturais por parte da ideologia dominante. A partir daí a leitura feminista questiona os padrões que organizam as experiências de homens e mulheres e que dão legitimidade a determinados tipos de discurso, identidades e relações, ao mesmo tempo que excluem inúmeros 'outros'. A leitura feminista é, então, um modo de desestabilizar a matriz que sustenta discursos universalizantes sobre as identidades do sujeito e que, ainda hoje, funcionam dentro da lógica da opressão e do silenciamento de vozes que ousam escapar de determinados esquemas representacionais que os enquadram e os definem. Uma leitura feminista se estabelece à medida em que busca a desestruturação da lógica patriarcal e heterossexista, apontando para o horizonte de novas possibilidades de leituras dos códigos textuais e para o desafio de estar em um movimento constante de ressignificação e reinterpretação dos textos, dos símbolos, da vida, das relações humanas com seus múltiplos arranjos e suas tênues fronteiras."
(Simone Sampaio, Departamento de Teoria Literária, Universidade de Brasília, simonesampaio@zaz.com.br))******************
Grosso modo, concordo com a distinção feita pelas outras colegas, mas acho que o fato de não vestir a camisa do feminismo não torna necessariamente uma leitora crítica inconsciente da sua condição de mulher e das determinações dessa condição no seu ofício. Seria bom que encontrássemos um termo menos feio em português para a tal leitora gendrada, que é horrível ou genderizada, que é tão horrível quanto. Afinal, trabalhamos com linguagem e devemos ser sensíveis às palavras. Por que não inventar algo que se desprenda um pouco mais da palavra em inglês?
( Ligia Chiappini (lchiappi@zedat.fu-berlin.de)
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Não sei se eu entendo bem o que é uma leitora feminista e uma leitora gendrada, porque penso que não compreendo uma leitora separada de ser também escritora. Penso na interpelação que cada uma admite e percebe com relação aos efeitos de "essência": leitora, e não leitor, feminista, e não masculinista, gendrada e não instituída. Penso que Ligia fala bem de um detalhe gritante: por que emitir a discussão partindo de um termo que já remete a um centro difusor hegemônico, que é a língua inglesa? Talvez a feminista estabeleça um roteiro de prática política, que visivelmente tenta inverter a lógica patriarcal. Não gosto da idéia! Por que a lógica patriarcal se institui também com o apoio que corpos femininos dão aos valores patriarcais. Muitas mulheres gozavam ao ver aquelas que eram consideradas bruxas arderem nas fogueiras. Talvez seja melhor pensar como desmontar a máquina de fabricação de termos e essências; a lógica da trama, para mostrar a trama se fazendo na oficina dos valores, dos discursos, das pequenas armadilhas que o discurso nos prepara e que preparamos nos discursos. Delirei? Talvez sim...
(Eliana Mara de Freitas Chiossi, professora e doutoranda da UFBA: achiossi@ufba.br )
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Enquanto fui lendo esse princípio de discussão aqui esboçado, dois sentimentos e respectivas reflexões foram tomando conta de mim: primeiro, sobre a fecundidade desse debate, pois vocês mulheres conseguiram introduzir novo olhar na medida em que conquistaram uma voz, um discurso com dicção e sensibilidade próprias no horizonte dominado historicamente pelo homens; segundo, visto que nos instituimos pela linguagem, e esta possui uma estética fina e sutil, fui reagindo a esses termos horrorosos (para dizer o mínimo, pois que também trazem a marca de nosso colonialismo espritual) "gendrada", "genderizada"..., quando se poderia dizer algo como «generizada», pelo menos na linha do nosso legado lingüístico. Felizmente, ao chegar ao texto de Ligia Chiappini encontrei uma parceira de sensibilidade. Como quer que seja, felicitações pelo valor da discussão. Mas nem como tal discussão chegou à minha caixa postal, porém fiquei contente.
(Eduardo Diatahy B. de Menezes, Professor Titular do Doutorado em Sociologia Universidade Federal do Ceará)
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Ligia Chiappini tem razao quanto ao feio dos termos gendrada e genderizada, mas o generizada proposto pelo Eduardo também nao vai muito longe. Na verdade, sao problematicos sao quase todos os termos com que trabalha a critica feminista ou mesmo quase tudo que circunscreve o universo feminino [o que vem a ser ? ], a mulher [idem], a sexualidade feminina [ibidem], já apontava Freud em sua pergunta, celebre e inaugural. Quanto aos conceitos em pauta, penso que toda critica "gendrada" eh tambem feminista, se compreendemos a primeira como uma posição de leitura crítica dos objetos da cultura de forma "interessada", no sentido de trabalhar com os valores e com as diferentes ideologias que circunscrevem homens e mulheres em papeis sociais, cada vez mais moveis, mas ainda assim (e nos tempos atuais) hierarquizados. Outro aspecto interessante desse papel de leitora critica eh que ele nao eh intrinseco aa mulher, nao eh da ordem de nenhuma essencia, mas um lugar que se ocupa para ler, interessadamente, tais objetos da cultura, do mesmo modo que se pode, por exemplo, ler um texto a partir de uma perspectiva psicanalitica, ou formalista, ou sociologica, pode-se tambem le-lo sob uma perspectiva feminista. A diferença estaria em que as primeiras disciplinas ja tem um corpus teorico estabilizado, enquanto a critica feminista nao o tem, nem podera te-lo, mas se apropria de todas as outras para atuar, constituindo-se nesse gesto basico transdisciplinar. Alem disso, determinadas mulheres podem ocupar tal lugar com maior eficacia, por obvias razoes.
(Vera Queiroz, Profª Adjunta da UFF, vqueiroz@unikey.com.br )
Lúcia,seu texto é extremamente interessante,tenho lido muito aqui,em seu espaço.Aproveito para parabenizá-la querida professora e doutora em educação.Sinto orgulho quando percebo que ainda há esperança para nós educadores.Parabéns pelo dia do professor! Um grande abraço!
ResponderExcluirQuerida Marli,
ResponderExcluirPerdoe-me pela longuíssima demora, mas só agora vi seu comnetário. Com a nova interface do blogspot, fiquei perdida, mas já estou me familiarizando. O blog é uma ferramenta que tem me ajudado a minimizar a ansiedade de poder compartilhar conhecimento com os meus alunos, colegas de profissão e pessoas interessadas pela literatura. Um abraço