quarta-feira, 10 de agosto de 2011

A Menina que Tinha Medo do Vento, Nadja Nunes, 2010

O livro de literatura infantil da “debutante” Nadja Nunes traz conteúdo, linguagem e criatividade de quem já é veterana. De forma atraente, a autora cria a história de uma menina chamada Júlia que convive com a sua avó Maria a quem diz ter medo do vento. Em diferentes momentos, a avó tenta afastar o medo da menina, mostrando as diversas contribuições do vento para a vida, mas, relutante, a experiência da menina sobrepõe-se ao discurso convincente da avó, até que esta descobre a razão.

A narrativa nos possibilita diferentes leituras, seja de viés pedagógico seja literário. Do primeiro ponto de vista, a trama mostra as idas e vindas daqueles que tentam compreender os comportamentos das crianças no intuito de alterá-los, no caso da narrativa, o medo que a menina tinha do vento. Já da perspectiva literária, a referência a passagem do sentido conotativo para o denotativo na criança nem sempre é uma tradução simples como é para o adulto. A revelação da menina mostra que a experiência negativa, de isolamento, da solidão, foi devido a uma ação do vento. Quando o menino, Gil, abriu a porta disse: “Foi o vento que fechou a porta”. Neste momento, a personificação através da ação do vento, o sujeito da oração, fez com que a menina o investisse de autonomia e intencionalidade, levando-a a ter medo, já que não se importou com o fato de ela estar do lado de fora, impedindo-a que entrasse em casa.

Nadja Nunes
A autora trouxe o que há de mais particular na experiência linguística da criança que consiste na tradução das camadas de significação que dependem do grau de abstração e da transferência na correspondência dos componentes entre significante e significado alado ao contexto. No caso acima, o vento ganha autoridade de ser vivo, humano, porque ele realiza uma ação própria das pessoas, o que facilita a transferência de sentido por parte da criança, com base em seu acervo.

Outro aspecto importante no livro é em relação às práticas sociais da personagem Júlia, muito comum às crianças urbanas de hoje, que é a ida ao shopping e ao cinema. Raramente vemos essa experiência sendo representada nos livros de literatura infantil, o que aproxima o(a) leitor(a) da narrativa e facilita a sua identificação. Geralmente, o espaço de ação das crianças nas narrativas literárias se passa em casa, no quintal, na rua, na escola ou em uma fazenda, o que limita muito o ambiente de ação e não representa a realidade de muitas crianças.

Por fim, outro elemento importante da narrativa é o traço autobiográfico, aspecto que marca a escrita de muitos escritores, principalmente as mulheres. A autora se chama MARIA Nadja (assim como a avó da narrativa) e a neta se chama JÚLIA (assim como a personagem). A avó também é escritora e ao ouvir a história da menina, resolve escrevê-la.


Se menina deixou de sentir medo? Eu não sei, vale a pena ler para conferir.

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